sexta-feira, 18 de março de 2011

Cola: cobertor, alimento e euforia

No Rio de Janeiro, moradores de rua, usuários de drogas e “pedidores” de esmolas ficam espalhados pela cidade. É na zona sul – Copacabana, Botafogo, Glória, Catete, é na área central, é na zona oeste – Bangu, Campo Grande, Santa Cruz... Dessa vez não há segregação socioespacial. É desde as áreas mais ricas às áreas mais afastadas, um tanto quanto marginalizadas.
Cenas como um papelão por cima de um homem e, muitas vezes, até de uma família, nas calçadas cariocas, tornaram-se rotineiras. Junto a ela, a banalidade da cola (redutores, solventes) em garrafinhas de água sendo levadas ao nariz de segundos em segundos por crianças – ressalto que em muitas ocasiões vistas por mim, crianças com apenas quatro anos. É claro que há os adolescentes e os adultos com o mesmo hábito, e muitos são esses. Entendi um dia que essa substância inibe a fome e o frio. E ainda fornece a eles uma espécie de pilha para que fiquem acordados por mais tempo; euforia, portanto.
Os pontos de ônibus da cidade têm por vezes crianças pedindo carona aos motoristas ou pedindo dinheiro a quem também está no ponto esperando o seu coletivo passar. Você, ao repará-las, consegue sentir o lado criança que muitas vezes está escondido por baixo de corpos já formados e uma realidade dura a qual nunca foi escondida delas. Nas noites frias e quentes, as meninas têm como roupas tops e shorts, ou vestido... os meninos têm bermuda e blusa. Ambos descalços, quando com um pouco mais de luxo estão de chinelo.
No entanto, nós, que nos vestimos de acordo com o bom ou mau tempo, insistimos em fechar sempre os olhos para realidades tão duras. Cada um justificando com o argumento que considera melhor. Não percebemos, portanto, que essas crianças vão crescer e, sem nem precisar muito, já carregarão filhos na barriga. Que depois, poderão ser cópias dos pais... E outros de nós continuarão a fechar os olhos... E as calçadas serão sempre feitas como colchão.

Bianca Garcia

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