sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Dois gringos pelos contornos do Rio de Janeiro

Cá estava eu em um desses ônibus com destino à zona sul da cidade. Esses que vez ou outra tem uns gringos, ou transitando de um lado para outro ou chegando com suas mochilas. Dessa vez eram dois. Dois meninos, mais precisamente.

O trajeto era Rodoviária – Leblon. Ao entrar no ônibus, logo os percebi. Os mochilões e as bochechas rosadas entregavam logo que estavam a passeio. Estavam quietos, observando. Os olhares atentos a tudo me intrigaram. Primeiro, poucos visitantes do Rio de Janeiro conhecem suas mazelas. Percebi que ambos os meninos repararam, ao longo do percurso, na diferença do ambiente. Quando os encontrei no ônibus, estávamos na Gamboa e, com toda a chuva que há pouco caira, o ônibus enfrentou um cruzamento onde a água passava dos pneus. Com cheiro de esgoto, crianças mergulhavam na piscina, formada na rua, de água suja. Essa parte os meninos não viram. O ônibus seguiu, sentido ínicio da Rio Branco. Ao avistar a Avenida Presidente Vargas, murmurinhos começaram. Era um bloco famoso da cidade. Aqui no Rio, o carnaval dura por mais alguns dias, ou melhor, começa antes da data marcada. E lá estava o bloco, a uma semana do carnaval. Os meninos se entreolharam e sorriram. Um sorriso de ‘olha o que poderemos aproveitar outro dia’. Mudando sua trajetória, o ônibus pegou o aterro. Suas testas franzidas me deixaram entender seus pensamentos: era a parte linda do Rio prestes a vir. E eles já tinham percebido a diferença entre a Gamboa e a Rio Branco.

Os maravilhosos minutos pelo aterro, com àquele vento no rosto, os estrangeiros também puderam sentir. Os cariocas privilegiados, o têm todos os dias, e eles certamente pensaram nisso. Mas pensaram amplamente, como se todos os cariocas tivessem o privilégio. Bem, não é bem assim. Enfim, neste percurso agradável a qualquer hora do dia, estávamos nós. Agora, uns 10 passageiros. Como a chuva caira há pouco tempo, o vento tinha àquele cheirinho de mato molhado. O céu, cinza azulado com algumas linhas avermelhadas. Lindo, particularmente. Ao avistar o Pão de Açúcar, não tiravam os olhos. Os meninos tinham olhar de quem gosta muito do que está vendo. Olhar de que é real àquela cena. Acompanharam, pelo início do aterro, as curvas pequenas. Ao chegar a Botafogo, àquela cena tão próxima, como se desse para esticar o braço e tocar em um bondinho. As linhas vermelhas estavam próximas ao Cristo Redentor. Um dos meninos percebeu. Eles não se falaram mais. Cada um ficou pro seu lado percebendo a beleza que chegava a seus olhos. O que avistara o Corcovado voltou a olhar, confuso, para o Pão de Açúcar, como em uma indecisão de qual monumento olhar mais um pouco.

Ignorei as greves, os problemas políticos – que dois senhores, inclusive, discutiam no caminho. Um deles dizendo que nunca viu um governo tão ruim quanto o que está no comando do Rio de Janeiro há oito anos. Complementou que foi o mais sem vergonha - penso eu, dos seus 68 anos vividos. Apesar de ser uma conversa do meu interesse, os senhores estavam distantes, e pouco dava pra ouvir, além da invasão cujo estava fazendo. O jornalista é por si só um curioso, mas, neste caso, ultrapassaria a curiosidade. Enfim, tentei esquecer os problemas pelos quais a “cidade maravilhosa” passa, e deixei fixar-me nos olhares estrangeiros sobre o Rio de Janeiro. 

Bianca Garcia

4 comentários:

  1. Eu costumo dizer para aqueles que não conhecem o Rio que "a cidade dos turistas é das mais lindas do mundo". Pena que eu não cresci na cidade dos turistas, mas na outra, aquela, a das mazelas, que me fizeram desejar, buscar e conseguir me libertar.

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  2. Mas seria mesmo uma pena? Eu também não cresci, cresci bem distante por sinal. Acho que ter conhecido o outro lado primeiro foi um dos maiores privilégios que eu tive, o segundo foi continuar próximo dele.

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  3. Bianca e Sandro, Bom Dia!

    O papo de vocês lembrou-me uma das aulas de Economia Política que frequentei ano passado, fruto de meu "heróico" retorno aos bancos escolares.
    Nela, o mestre, grande admirador do economista Celso Furtado (1920-2004) disse algo como: 'O Celso tinha o olhar voltado para dentro e para baixo, uma visão, portanto, contrária à da maioria dos versados em Ciências Econômicas.'
    Assim, meu professor resumia o grande sonho de Furtado: construir um Brasil economicamente - e tecnologicamente - menos dependente e socialmente mais justo.
    Pois é... infelizmente muitos de nossos acadêmicos e intelectuais não gostam do "cheiro do povo"...

    Abraço,

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  4. Pois eu não gosto do cheiro do terno e gravata diário, Antonio.
    Sim, este é um preconceito - e eu me esforço para não tê-lo.

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